quarta-feira, 30 de julho de 2008

Entrevista JULIETTE 001 (Trecho)

Entrevista Vladimir Carvalho.
Cineasta Paraibano.

Rafael Urban: Com Aruanda se inicia um ciclo importante de documentários na Paraíba. Como foi participar desse projeto?

Vladimir Carvalho: Aruanda foi a minha porta de entrada no cinema. Fui convidado para fazer o roteiro juntamente com João Ramiro Mello, que depois seria meu parceiro em meu primeiro curta (Romeiros da Guia, 1962). Foi com Aruanda que nos introduzimos ao cinema na prática. A Paraíba, naquele momento, não era local de muita produção. Tirando Rio e São Paulo, o resto era província: o Rio sendo a corte e São Paulo, a capital econômica. A Paraíba no fim dos anos 1950 tinha a universidade (UFPB) há menos de 10 anos. Por conta dela, apareceu o cineclube, em que as pessoas queriam filmar – o que era uma ousadia. No Rio, depois da Vera Cruz, havia um movimento se esboçando – com Nelson Pereira dos Santos e Rio 40 graus – e isso agitou muito as nossas cabeças e influenciou muito a gente. Linduarte sugeriu que filmássemos a respeito de uma reportagem que ele havia feito sobre um lugarejo em que o povo sobrevivia por fazer cerâmica e algodão nativo. Não tínhamos prática, éramos auto-didatas. Decoramos de trás para frente o Tratado de La Realización Cinematográfica, de Leon Kulechov. Era uma formação livresca, mas para a nossa felicidade deu certo. Com Aruanda, Linduarte fez um filme que até hoje é referência do documentário brasileiro. Glauber dizia e escreveu que foi um divisor de águas. Antes, havia vagamente um documentário brasileiro feito por Umberto Mauro, mas de forma bissexta. Com o filme, eu e João Ramiro tivemos vontade de fazer mais. Não tínhamos o prestígio de Linduarte e resolvemos sair da Paraíba. Fui a Salvador fazer o curso de Filosofia na UFBA e João Ramiro foi trabalhar no Rio. Por conta disso, ele revelou-se um montador muito bom, inclusive editando meu primeiro filme. Eu fiquei na Bahia, pois lá havia um movimento cinematográfico. O Glauber estava começando o segundo filme, Deus e o Diabo na Terra do Sol (1964), depois de Barravento (1962).

R.U.: O Glauber fez uma série de elogios a você.

V.C.: Ele me incluiu no livro “Revolução no Cinema Novo”, aquela coisa curiosa que ele fez como se fossem verbetes de dicionário. Enfim, foi esse o início. Faz mais de 40 anos que vivo entre Bahia e Rio.

R.U.: Nos créditos de Aruanda você aparece como assistente de direção.

V.C.: Houve uma espécie de cisão entre nós, pois o Linduarte não colocou o que realmente fomos: roteiristas e depois assistentes. O Ramiro foi mais assistente que eu, ele esteve em toda a filmagem. Então, nós rompemos com Linduarte. Mas isto, hoje, está superado. Fizemos cada um uma carreira em separado. Isto foi como entrei para o cinema. Depois do curso de Filosofia em Salvador fui assistente do (Eduardo) Coutinho em Cabra Marcado para Morrer (1984).

R.U.: Você estava cobrindo as Ligas Camponesas nessa época.

V.C.: Eu fui correspondente dos “Novos Rumos”, que era o veículo oficial do Partido Comunista no Rio de Janeiro, um jornal moderno, em que todos os intelectuais do partido contribuíam. Eu era um simples repórter. Sobre as Ligas Camponesas, mandei matéria e acompanhei de perto. Entrei em contato com o João Pedro Peixeira, que foi depois conhecido como “cabra marcado para morrer”. Eu o conheci porque era militante do partido e havia uma camaradagem e solidariedade em hospedar as pessoas, pois o partido nunca tinha recursos. João Pedro vinha para as reuniões, ficava hospedado lá em casa e ficamos amigos. Quando o Coutinho foi para o Nordeste e resolveu fazer o filme, sabia que eu era amigo de João Pedro e Dona Elizabeth Teixeira. Sabendo também que eu já tinha me iniciado no cinema com Linduarte, ele me convidou para ser assistente dele e eu fui para Pernambuco. Lá fomos surpreendidos com o Golpe Militar.

Leia continuação desta entrevista na edição 001 de JULIETTE.

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