segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Editorial 004

“O melhor é certamente separar o artista da obra, a ponto de não tomá-lo tão seriamente como a obra. Afinal, ele é apenas a precondição para a obra, o útero, o chão, o esterco e o adubo no qual e do qual ela cresce – e assim, na maioria dos casos, algo que é preciso esquecer, querendo-se desfrutar a obra mesma.”

Friedrich Nietzsche, no livro “A genealogia da moral”


JULIETTE chega à sua quinta edição abrindo uma questão suscitada pela entrevista concedida pelo cineasta Karim Aïnouz a nosso editor Rafael Urban e ilustrada pela frase acima do filósofo Nietzsche: artista, vida e obra formam um conjunto inseparável ou estão segmentados?

Ainda inserido na tradição do século XVIII, apesar de situado no XIX, Nietzsche considera a obra de arte como fruto de uma genialidade que ultrapassa a individualidade do homem dotado deste “gênio”, daí a necessidade de se avaliar a obra independentemente de sua vida particular. A obra de arte deve ser apreciada por sua aura distanciada do mundo cotidiano. Nada na vida deste homem deve influenciar na avaliação de sua obra.

Tradição esta de toda a estética romântica e que se contradiz com as próprias considerações do filósofo a respeito da vida como obra de arte. Mais tarde, retomaria um estilo do pensamento pré-socrático de estóicos e epicuristas, por exemplo, em que viver, pensar e agir são coincidentes. Deste modo, irá concluir Nietzsche, cada homem deve fazer de sua vida particular uma obra de arte, pois todo homem é um artista. E aqui, muito antes de Marcel Duchamp, o conceito de arte e sua aura são desfeitos. O cotidiano invade a definição de arte e artista.

Karim Aïnouz, com franqueza e delicadeza, nos oferece a construção de sua filmografia de um ponto de vista particular, costurando vida e obra e nos oferecendo o que hoje, talvez, seja fator relevante no momento de se desvendar o artista: sua autenticidade ao definir seus temas e atividades.

JULIETTE ainda traz texto de Tatiana Monassa investigando, ou ainda melhor, percorrendo o trabalho de Karim sem situá-lo em contextos prontos, mas colocando-o como um “cavaleiro solitário” no cinema nacional, devido ao modo como constrói sua individualidade como homem e artista.

João Krefer analisa dois curtas-metragens da diretora curitibana Heloisa Passos – diretora de fotografia de um dos primeiros filmes de Karim – percebendo nela uma ligação com a cidade que não se torna “bairrista” no sentido limitador do termo, mas percebendo que talvez sempre haja algo de universal que se revela naquele que percorre a sua origem.

Fábio Allon nos apresenta a continuação de sua investigação acerca das Arquiteturas Fílmicas iniciada em JULIETTE 003 e tendo como ponto de partida o espaço criado por Jacques Tati (Tativille).

Já Arthur Tuoto traz à tona a obra de um cineasta ainda pouco conhecido, mas já despontando como um dos mais originais do cinema atual, o tailandês Apichatpong Weerasethakul.

Nesta edição a sessão de fotos Making Of registra o curta-metragem Nós (2008), de Fábio Allon.

Continuemos com a língua solta e até 2009.

Merci.
Josiane Orvatich

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Lançamento JULIETTE Edição 004

A quinta edição de JULIETTE Revista de Cinema será lançada nesta quinta-feira, 11 de dezembro, às 19h30, na CINEMATECA DE CURITIBA.

O lançamento será acompanhado da exibição dos filmes Seams (28 min, 1993) de Karim Aïnouz e Viva Volta (15 min, 2005) de Heloisa Passos, seguidos de debate.

A publicação de JULIETTE deste mês traz ensaios críticos de Tatiana Monassa, Fábio Allon, João Krefer e Arthur Tuoto. A entrevista do mês é com Karim Aïnouz.

JULIETTE é uma produção da Jaguadarte Filmes e conta com o apoio da GP7 Cinema e Atores, Tecnicópias Impressões Digitais e VLS Produções Serigráficas.

Serviço
Lançamento JULIETTE Revista de Cinema
Data: 11 de dezembro de 2008
Horário: 19h30
Local: CINEMATECA DE CURITIBA, Rua Carlos Cavalcanti, 1174

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

Editorial JULIETTE 003

“As filas (e as rendas) nos dizem que as pessoas estão indo ao cinema – não que estejam se divertindo (...). Eles (da indústria) acham que as rendas são prova de que as pessoas estão satisfeitas com o que recebem, do mesmo modo como os executivos de TV acham que os programas de maior audiência são o que os telespectadores querem, em vez dos que aceitam”.
Pauline Kael, “Por que os filmes são tão ruins”, no livro “Cidadão Kane e outros ensaios”.

JULIETTE em sua quarta edição, a de número 003, traz uma reflexão implícita sobre um dos temas mais pesados, no sentido severo de tantas vezes condenar um filme, e polêmicos acerca da arte/ indústria cinematográfica: a bilheteria.

Em entrevista concedida a nosso editor Rafael Urban, Philippe Barcinski aponta para duas grandes necessidades no cinema brasileiro: planejamento e reconhecimento do valor dado à obra pelo público. Acerca deste segundo tema, temos uma oposição ao nosso entrevistado da edição anterior, Carlos Reichembach, defensor da não necessidade de se avaliar um filme pelo seu resultado de bilheteria. Ao menos não avaliar como obra de arte. E como indústria?

Eis a dicotomia desta “ferramenta” nascida na década de 1890, mistura de arte e técnica, resquício da teoria do autor romântico de todo o século XIX, “gênio dotado de intuição” e mercado financeiro. Como excluir a necessidade de renda de uma arte que, salvo exceções, custa tão caro? Barcinski aponta para uma reflexão de mercado já no projeto inicial, em seu desenvolvimento, desde o roteiro até o local de exibição. Aceita as produções modestas (mal-pagas) e inventivas, mas garante que os profissionais não podem sobreviver somente com estes trabalhos.

A questão permanece lançada com um convite à reflexão ao papel não só da própria obra cinematográfica, mas ao da crítica: como incorporar a recepção da obra a obra?

JULIETTE ainda traz quatro ensaios críticos com estilos e temáticas distintas. Fábio Allon parte da especificidade e delimitação do tema, com caráter de tradição mais acadêmica e especializada, analisando, a partir do espaço criado por Jacques Tati (Tativille), a composição da arquitetura - leiam-se aqui também cenários e direção de arte.

João Krefer, que vem contribuindo periodicamente com JULIETTE, percorrendo a história da vanguarda, nos apresenta novo ensaio e olhar sobre o tema. A partir de Ricciotto Canudo contextualiza mais algumas de suas características, defendo-as como configuradoras do “fazer fílmico”.

Luciana Cristo, em texto singelo, narra sua visita aos antigos lugares (já outros comércios) e salas de cinema de rua curitibanas e faz uma reavaliação da atividade de exibição de filmes nos dias de hoje.

Eduardo Valente, editor da revista eletrônica de cinema CINÉTICA apresenta ensaio sobre o longa-metragem paranaense Mystérios, de Beto Carminatti e Pedro Merege, reconhecendo o ineditismo da narrativa e, talvez por isto mesmo, sua dificuldade em dar-lhe um acabamento final.

Contamos nesta edição com duas novas sessões. Publicações literárias e fotográficas. Está aberto o espaço para textos narrativos ficcionais que dialoguem de alguma maneira com o cinema, seja num personagem ou numa idéia, apostando na criatividade da linguagem escrita. A sessão fotográfica destina-se ao Making Of de produções cinematográficas. Nesta edição a sessão dedicada à ficção tem texto de Luiz Felipe Leprevost e a sessão de fotos dedicada ao Making Of registra o curta-metragem em Super-8 de Murilo Wesolowicz.
Os interessados podem enviar seu material para nosso email de contato, localizado na contracapa da revista.

Continuemos com a língua solta, até a edição de dezembro.

Merci.
Josiane Orvatich