quinta-feira, 9 de outubro de 2008

Entrevista JULIETTE 002 (Trecho)

Entrevista com Carlos Reichenbach
Cineasta gaúcho radicado em São Paulo

Josiane Orvatich: O seu pai era editor da revista Lady, na década de 50, uma das primeiras chamadas “revistas femininas” no Brasil. Você disse em outras entrevistas que começou a se interessar por cinema por causa de um roteiro publicado nela. Como era o conteúdo desta revista?
Carlos Reichenbach: O meu pai era um industrial gráfico e foi bastante respeitado na época, pois ele dirigiu uma revista muito popular na década de 1950, a Seleções Reader’s Digest. Até hoje eu encontro gente que me pergunta: “Você editava a revista Seleções?”; e eu digo: “Não, era o meu pai que tinha o mesmo nome”. Ele também editou e lançou no Sul a revista Casa e Jardim. Ele começou no Brasil o que chamamos de imprensa dirigida: lançou a primeira revista para médicos, O Médico Moderno, a primeira revista com publicação voltada para o produtor agrícola, Dirigente Rural. Mas o projeto pessoal da vida dele foi essa revista Lady, que foi a primeira voltada para mulheres que não tinha fotonovela. Ao contrário, tinha um grupo de redação com intelectuais de ponta e escritores. Tinha, inclusive, coluna de política. De certa forma, ela foi uma revista meio pioneira, era uma revista de viés quase que intelectual para um público acostumado com fotonovela.

J.O: Ela tinha uma seção de cinema ou eventualmente tratava sobre o tema?
C. R.:Nessa época não tinha Cláudia, Nova, que só foram criadas duas décadas depois. Então, nesse sentido, a Lady foi extremamente pioneira. O que teve um preço muito alto, custou a saúde do meu pai e os dois infartos que ele teve para poder manter a revista viva. A publicação tem uma importância histórica, pois é nela que foi publicada a novela Jovita, de Dinah Silveira de Queiroz, que o cineasta Oswaldo Sampaio se interessou em adaptar para o cinema. Quando o roteiro ficou pronto, foi feita uma leitura pública, mas pequena, para poucas pessoas. E esse foi o meu primeiro contato direto com o texto cinematográfico e algo que me impressionou demais. A leitura do roteiro de Jovita, que infelizmente não foi filmado, foi a primeira coisa que me despertou a minha curiosidade pelo cinema, especificamente pelo roteiro cinematográfico.

J.O.:E como você entendia o cinema naquela época?
C.R.:Para mim, desde muito cedo, o cinema tinha esse aspecto de corresponder a uma soma de outras expressões culturais, como a literatura, a dramaturgia e a música, que foi a atividade que, indiscutivelmente, me conduziu ao cinema. É muito louco porque quando me perguntam até hoje qual foi o primeiro filme que me fez gostar de cinema eu não hesito em dizer que foi uma fantasia “infanto-surrealista” chamada Os 5000 mil dedos do Dr. T (1953), de um diretor chamado Roy Rowland. É um filme cheio de fantasia e sonhos que narrava a história de um aluno que era torturado pelo seu sádico professor de piano. De certa forma, a minha formação foi bastante traumatizante. Antigamente se ensinava o piano com muito rigor, especialmente a musica clássica. Eu fui aluno do primeiro curso de cinema de nível universitário aberto em São Paulo, chamado Escola Superior de Cinema São Luiz. Era um curso pago, uma instituição católica ligada à Faculdade de Economia São Luiz, e eu paguei com os cachês que recebia por tocar em clubes de campo e desfiles de moda como tecladista de um grupo musical chamado TNT Trio. De certa forma, o cinema também sempre esteve muito ligado à música na minha formação. Por isso eu digo: o filme que me fez apaixonar-se por cinema foi um onde a música é personagem. A música e a literatura foram as coisas que me conduziram ao cinema.

A continuação desta entrevista, realizada por Josiane Orvatich, encontra-se na edição 002 de JULIETTE Revista de Cinema.

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